ALCEU LIMA
Especial para o VERBO ONLINE, em Embu das Artes
Apontado pela Polícia Federal como o principal envolvido no desvio de recursos em contratos de fornecimento de kits escolares à prefeitura, Ney Santos (PRB) pôs em prática o esquema de corrupção a partir de 2016, quando ainda era candidato a prefeito, mostra relatório da operação deflagrada pela PF na quarta-feira (9). A revelação evidencia que Ney, certo de se eleger, teve pressa, recompensou o “amigo” pagador de propina logo no início da gestão, em 2017.
As conclusões se baseiam no relatório da PF, que traz conversa de Rodrigo Passos Fernandes, assessor de Ney, com Carlos Zeli Carvalho, o “Carlinhos”, dono da empresa Reverson Ferraz da Silva ME, fornecedora de kits escolares à prefeitura. “Tá, que horas você acha que está por aqui?”, indaga Rodrigo. “Na parte da manhã. Vamos sair daqui umas 8h. Umas nove, nove e meia ‘to’ passando ali no Samu”, diz Carlinhos. “Fechou. Você me liga”, fala o assessor de Ney.
Carlinhos puxa assunto e continua: “Deixa eu te falar: eu tenho conversado, na sexta-feia, com o JOTA, o EDSON. Aí ele falou pra mim: ‘CARLINHOS, como é que tá lá?’ Ah, tá tudo em ordem né? Lá uma ligadinha ‘lé’ [lá], que parece que tem boi na linha'”. Rodrigo busca tranquilizar o empresário, mas explica qual é o problema: “Não, tá tudo bem. Na realidade é o seguinte: eu peguei os cheques lá, depois que eu fui ver. Tá pré-datado pra depois né?”, questiona o auxiliar de Ney.
A conversa ocorreu em 26 de setembro de 2016, segunda-feira, a seis dias das eleições, diz o relatório. “No dia seguinte, em 27/09/16, CARLINHOS (‘C’) liga diretamente para o atual prefeito, na época candidato, NEY SANTOS (‘N’), avisando-lhe que está levando o “material” (dinheiro) para seu assessor RODRIGO, ao que Ney solicita-lhe que não seja da mesma forma anterior, por meio de cheques pré-datados, reiterando, a expressão ‘Me ajuda aí'”, relata ainda a PF.
Carlinhos fala: “Rapaz, é… eu não queria ‘ta’ atrapalhando não, é que eu to levando material lá pro nosso amigo… ‘ta’ tudo em ordem aí?” Ney diz: “Tá… fala com o Rodrigo”. Carlinhos: “Beleza, beleza”. Ney: “Que eu ‘to’ fazendo caminhada, né”. Carlinhos: “Exatamente”. Ney aí se irrita e repreende o empresário: “Mas não faz que nem da outra vez não, porra, senão não adianta nada, meu amigo. Até sexta-feira eu tenho que desenrolar tudo… se não, depois 9 anos, entendeu?”
Ao citar o último dia útil antes da eleição, Ney indica precisar do “material”, dinheiro, segundo a PF, até o dia do pleito. “Não, sim! É o que tô falando, se eu deixar o material com o Rodrigo… falei com ele que a gente tá com uma dificuldade por causa do meio… que tá tudo enrolado aí… mas a gente vai levando aí”, diz Carlinhos. Ney: “Não adianta nada você fizer desse jeito aí… tem que esperar virar, entendeu… não adianta pra mim… faz uma força tarefa lá… me ajuda lá”.
Carlinhos volta a se queixar, para justificar o “negócio”: “Beleza, beleza! A gente tá na dificuldade, por isso que a gente tá (inaudível) o negócio… uns dias aí pra frente… mas ‘ta’ finalizando… na reta aí…”. Ney se irrita: “Tá foda! Me ajuda aí, tá bom?” O empresário para de reclamar: “Tá bom… eu vou ligar pro Rodrigo”. Com base nos áudios transcritos, a PF conclui que “todos os valores (em espécie, transferências e cheques pré-datados) são entregues de fato a NEY SANTOS”.
A PF atenta que “identificou cinco cheques” de Carlinhos depositados na conta de Fernando da Silva, sócio de Rodrigo, no período de abril a novembro de 2016, em “benefício de Ney”. “Um dia após o depósito do último cheque em 16/11/16, Carlinhos se encontra com NEY SANTOS em 17/11/16. O contato direto dirimi quaisquer dúvidas, deixando explícito que NEY era o beneficiário indireto dos valores depositados na conta corrente do sócio de seu assessor”, frisa.
“Considerando-se o pagamento de vantagens indevidas por CARLINHOS a NEY durante o ano de 2016 e a eleição deste candidato em outubro, é possível que essa reunião em novembro de 2016 tenha sido realizada para definir as questões acerca da contratação pública de empresas de CARLINHOS. Isto porque foi localizado com a empresa REVERSON FERRAZ DA SILVA – ME, no valor de R$ 3.800.000,00 para fornecimento de kits de uniforme escolar”, diz o relatório.
A PF conclui que Ney “recebeu vantagem indevida do empresário CARLINHOS para fraudar procedimento licitatório em benefício de sua empresa”. “Os elementos coletados até o momento convergem para o efetivo recebimento de vantagem ilícita mediante a contratação fraudulenta da empresa do agente corruptor, ao que por ora temos indícios das práticas de corrupção ativa, corrupção passiva e fraude”, finaliza relatório. Contudo, Ney nega qualquer ilegalidade.
> LEIA NA ÍNTEGRA RELATÓRIO DA POLÍCIA FEDERAL SOBRE ‘CORRUPÇÃO’ NO GOVERNO NEY (págs. 281 a 289)
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