DOM ALOÍSIO ROQUE OPPERMANN, SCJ
É por demais conhecido o enorme impacto provocado pela queda do geocentrismo. Todas as pessoas, acompanhando o senso comum, consideravam tranquilamente a Terra como centro do universo. A Terra era estática, e tudo evoluía ao seu redor (a lua, as estrelas e o sol). Isso era “evidente”. E de repente, Kepler, Galileu e outros demonstraram que o nosso planeta não passava de um ínfimo grão de areia, obediente às leis harmoniosas da movimentação dos astros.
Mas pior do que isso foi a descoberta das mazelas do rei da criação, reduzido a um reles animal, pela teoria da evolução. A autoestima humana viveu décadas de perplexidade e até de horror, quando a verdade fundamental do universo virou de ponta cabeça. Até o século 16 Deus era a verdade central da vida: as motivações religiosas tinham nela a sua inspiração. O comércio, a lavoura, a educação, tinham um valor secundário. A atividade principal era buscar o encontro com a divindade. “Buscai primeiro o Reino de Deus e sua justiça. E o resto vos será crescentado” (Lc 12, 31).
Completando os males dos quatro cavalos do apocalipse (cap. 6), de repente, quem foi colocado no centro das preocupações, substituindo o próprio Senhor do Universo, foi o ser humano: sua indústria, a produção econômica… Isso de rezar, e invocar a divindade, tornou-se apenas um rodapé. O paraíso está nas nossas mãos e devemos concretizá-lo durante a nossa curta existência, dizem. Com isso o mundo não admira mais os Santos que se distinguem por orações profundas ou pelo ascetismo. Agora só valem os Santos que ajudaram o seu semelhante a sair da pobreza, que protegeram a saúde do povo, que defenderam os fracos contra as injustiças.
Mas Paulo 6º escreveu na “Evangelii Nuntiandi” que o papel principal da Igreja é anunciar explicitamente a pessoa de Cristo (nº 27). Sem que o antropocentrismo contradiga o teocentrismo, em absoluto. “A honra de Deus se concretiza na glória do Homem” (São Irineu em “Adversus Haereses”). Manter obras sociais vem em segundo lugar, no entanto. Como se essas dificuldades não bastassem, apareceu um grande sociólogo Max Weber, que vinculou o progresso do capitalismo ao protestantismo.
Os católicos estariam destinados a serem empregados e sem iniciativa. No Brasil essa teoria vingou, fazendo muitos católicos migrarem para as denominações protestantes, simplesmente “porque queriam ser ricos”. Mas o próprio Max Weber, se vivo fosse, teria enormes dificuldades – dentro dessa chave de leitura – de explicar o progresso capitalista da China, do Japão, da Coreia e de outros tigres asiáticos.
Dom Aloísio Roque Oppermann, SCJ, 77, é arcebispo emérito de Uberlândia (MG) – e-mail:
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