RÔMULO FERREIRA
Reportagem do VERBO ONLINE, em Taboão da Serra
O ator Clayton Novais, 39, que interpretou Jesus na 60ª Encenação da Paixão de Cristo em Taboão da Serra, criticou as autoridades políticas e religiosas do município em postagem no Facebook no último sábado (2). Novais disse que o governo municipal e a Igreja Católica, no caso o Santuário Santa Terezinha, no centro, dirigido por monsenhor Aguinaldo de Carvalho, se utilizam da encenação e pouco valorizam os profissionais que nela atuam.
A Paixão de Cristo no centro de Taboão da Serra foi criada por Manoel Francisco da Nova e começou tímida, em 1956, em um galpão nos fundos da Igreja Santa Terezinha, mas se tornou grandiosa e passou a ser aguardada com muita expectativa pelos fiéis. “São 60 anos de um trabalho feito pelo povo e pouco valorizado pelas instituições que se utilizam dela (leia-se governo e igreja)”, postou Novais, que neste ano interpretou Jesus pela terceira vez seguida.
Na publicação, Novais fala também da dedicação das pessoas envolvidas na encenação, para que o espetáculo aconteça, todos os anos, no feriado de Sexta-feira Santa. “Quero aqui deixar meus parabéns a todos que fizeram, fazem e farão parte dessa encenação e deixar também o meu pedido de valorização deste trabalho que é o mais antigo do Estado de São Paulo, quiçá do Brasil, e é tão pouco valorizado pela prefeitura e pela Igreja”, desabafou.
O ator, ainda no post, fala em descaso e faz um alerta relacionado ao cansaço diante dos sofrimentos enfrentados pelos participantes da encenação, que anualmente acontece na região central de Taboão. “A Paixão ainda sobrevive pela paixão dos integrantes que, já calejados de tanto sofrer com o descaso, ainda dedicam seus domingos para que ela aconteça, só que uma hora a gente cansa… Não esperem o cansaço chegar até nós”, completou.
Em conversa com o VERBO, Novais falou da luta dos atores, diretores e produtores da encenação e relatou que muitos já desistiram por não terem um incentivo por parte do prefeito Fernando Fernandes nem de outros prefeitos que passaram pela cidade. O ator disse que os políticos (prefeito e vereadores) se aproveitam do espetáculo para subirem ao palco e serem vistos pelo grande número de espectadores, no entanto, nada fazem de concreto para que os projetos culturais da cidade aconteçam.
“Nossos políticos deveriam se orgulhar deste evento, criar algum projeto que fixasse um verba própria para a execução e não apenas aparecer no dia e subir no palco para aparecer para a população. Precisamos de políticas públicas para a cultura. Hoje não temos mais formação de atores na cidade, as oficinas, que eram muitas, acabaram. Os festivais de teatro foram extintos, não há sequer um teatro na cidade, pois o Cemur [no centro] não atende as necessidades de um espetáculo”, disse.
Ele relatou também que o Santuário Santa Terezinha não tem ajudado concretamente na execução do espetáculo e nem cobrado da prefeitura melhor estrutura para a encenação. “O que gostaríamos da Igreja era um maior apoio para nos ajudar nas cobranças que fazemos à prefeitura. Queríamos uma participação maior da Igreja, já que no folder [de divulgação, distribuído antes do espetáculo] aparece que a realização do evento é feita pelo grupo Família Paixão, pela prefeitura e pelo santuário”.
Monsenhor Aguinaldo de Carvalho, pároco do Santuário Santa Terezinha, disse ao VERBO que “grande parte [das pessoas que trabalharam no espetáculo] são voluntários aqui no Santuário Santa Terezinha”, afirmação contestada por Novais. “Veja só… Nossa cidade é pequena, a referência religiosa é o santuário, logo, muitos frequentam lá. Entre eles, eu, todos são voluntários. Agora, afirmar isso já é demais”, disse o ator.
“Ela [Santuário Santa Terezinha] contribui com 100%, com tudo [na encenação]”, relatou o monsenhor, que posteriormente disparou: “Só o fato de estarmos lá [na encenação da Paixão de Cristo] já é a nossa maior contribuição, não tem dinheiro no mundo que pagaria nosso empenho, nossa presença, nossa participação”, finalizou.
“Ele disse quanto investiu na Paixão [de Cristo]?”, questionou Novais. “Eu respondo: no dia da encenação, [monsenhor Aguinaldo] nos cedeu emprestado [somente] três rádios comunicadores”, contou o ator, que diz estar cansado, pois faz teatro desde 1991 e afirma que sempre foi assim, sem a valorização devida da parte das instituições locais (Igreja e prefeitura).
Neste ano, devido à mudança do local da encenação, algumas melhorias foram realizadas por parte da prefeitura, porém, de acordo com Novais, sem a qualidade devida. “O novo cenário solicitado por nós teve a escolha das imagens centralizada em nossas mãos, porém o material utilizado ficou aquém do que esperávamos, pois a lona era muito fina e até rasgou pela força do vento”, contou.
Novais disse também que muitos atores vêm se afastando do espetáculo a cada ano devido à falta de valorização. “Alguns desistem de participar, pois não são valorizados, outros saem para outras encenações, como alguns que foram para a do Parque Pirajuçara [em Embu das Artes] que remunera seus artistas”, contou. “O que eu gostaria que todos entendessem é que os artistas não são mercenários, como já ouvi algumas vezes, mas eles pagam contas, pagam impostos, se alimentam, vestem e possuem outras necessidades, não vivemos apenas de luz e aplausos”, finalizou.
O VERBO entrou em contato com a Prefeitura de Taboão da Serra para comentar as críticas de Clayton Novais, mas a secretaria responsável não respondeu.