Empresa usa gari em greve para receber atrasados da prefeitura, diz Siemaco

Especial para o VERBO ONLINE

Lixo bloqueando rua é queimado no Intercap, em Taboão da Serra; presidente do Siemaco, Donizeti França

ADILSON OLIVEIRA
Especial para o VERBO ONLINE, em Taboão da Serra

Empresa de coleta de lixo propõe um reajuste salarial baixo para provocar os trabalhadores a entrarem em greve e pressionar a prefeitura a pagar atrasados, afirma o presidente do Sindicato dos Empregados em Empresas de Asseio e Limpeza Urbana de Taboão da Serra, Cotia e Região (Siemaco), Donizeti França, 59. Ele esclarece não ter “acesso à documentação” para afirmar que Taboão está inadimplente, mas lembra que a Cavo Serviços e Saneamento S/A, antes Viva Ambiental, chegou a emitir nota de que a prefeitura deve o equivalente a “14 meses de faturamento”, desde 2012. O governo Fernando Fernandes (PSDB) afirma que a partir do contrato em 2013 “todos os pagamentos estão em dia”.

A greve dos coletores de lixo e varredores de rua continua em Taboão, depois que a Cavo não concordou em pagar reajuste salarial de 9,5% proposto por empresas no ABC e também aceito pela Enob Ambiental em Embu das Artes, onde a paralisação foi encerrada nesta quarta-feira, dia 1º. “Mas aqui em Taboão os patrões estão irredutíveis”, diz França. “A cidade está um caos, na periferia estão colocando fogo no lixo, mas pedimos a compreensão da população, estamos lutando por salário digno para atendê-la ainda melhor”, diz. A greve continua até pelo menos segunda-feira, quando ocorre nova audiência de conciliação, mas pode durar ainda mais uma semana, até eventual julgamento.

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VERBO ONLINE – Não se chegou a um acordo na audiência de conciliação nesta terça-feira e a greve continua?
Donizeti França – Em Taboão da Serra continua. Quando estávamos [sindicato dos coletores e o patronal] na audiência com o juiz, chegou a notícia de que o [a categoria no] ABC havia concordado em receber 9,5%. Colocamos para o juiz que se o [sindicato] patronal apresentasse [proposta de] 9,5%, nós [categoria em Taboão e região] aceitaríamos também. No primeiro momento, o patronal concordou, mas disse que precisávamos fazer a assembleia nas empresas. Saímos para as empresas para tentar fazer a negociação diretamente – até então a negociação era feita pela nossa federação, que representa os 130 municípios [a categoria] no Estado de São Paulo, e a Soletur, que representa as empresas de coleta urbana no Brasil. Portanto, partimos para negociar individualmente. Por conta do ABC, conseguimos 9,5% [para a categoria] em Cotia, em Embu [das Artes], em Osasco. Mas em Taboão da Serra até agora [a empresa Cavo] não quis negociar conosco.

VERBO – Não houve qualquer conversa [até esta quarta-feira]?
França – Não. Mas parece que eles estão seguindo o Selur [sindicato patronal]. Pelo Selur, eles não dariam os 9,5%. Mas tudo que for abaixo de 9,5% não vamos aceitar.

VERBO – Antes, vocês queriam acima disso.
França – Nossa reivindicação inicial era 11,73%. Os patrões vieram com 6,5%. Depois, com 7,68%, também não aceitamos, e chegaram até os 8%. A partir daí, aconteceu a audiência [nesta terça-feira], o sindicato no ABC se reuniu com o patronal de lá e conseguiu 9,5%, e em algumas cidades conseguimos também. Mas aqui em Taboão eles estão irredutíveis.

VERBO – Como o sr. vê isso?
França – Lamento muito. A empresa não está dando o devido valor a seu empregado, a cidade de Taboão da Serra está sofrendo muito, a administração de Taboão da Serra está tentando pegar o excesso de lixo com os próprios funcionários, o que é uma coisa muito errada. Os funcionários da prefeitura não têm treinamento, não têm equipamento de proteção, a administração está colocando em risco a saúde do funcionário público. E a cidade está um caos, na periferia o pessoal está colocando fogo no lixo. Isso porque ainda estamos cumprindo liminar determinada pelo TRT [Tribunal Regional do Trabalho], que faz com que a gente autorize 70% da categoria a continuar trabalhando, por ser um serviço essencial. Só 30% está em greve, o que é tremendamente injusto também.

VERBO – No sábado passado, o VERBO acompanhou uma equipe com caminhão recolher o lixo em um bairro de Taboão da Serra, eram um motorista e três coletores. Um deles disse que havia no total em toda a cidade, recolhendo o lixo, quatro caminhões com três coletores cada, sendo que sem greve, segundo ele, são oito caminhões em operação. Havia quatro caminhões quando o normal são oito, mas aí não é 50%?
França – Não, e vou dizer porquê. Eles [empresa Cavo] estão com problema de manutenção na garagem, esses caminhões não estão em boas condições, na verdade há sete caminhões em boas condições. E outra: você viu três coletores, se correr atrás hoje [quarta], eu liberei quatro coletores, senão iam ficar extenuados. Aliás, já estão.

VERBO – Atualmente está tendo coleta domiciliar, ainda que reduzida.
França – Tem, coleta domiciliar e coleta hospitalar, todos os dias. De manhã saem quatro caminhões, à tarde saem quatro caminhões, cada um com quatro coletores.

VERBO – O governo municipal tem responsabilidade nessa paralisação, nesse impasse?
França – Por que foi resolvido no ABC? Os prefeitos de São Bernardo [do Campo], de Santo André sentaram com as empresas e garantiram que fariam o repasse do aumento às empresas. Agora, parece que aqui a administração não tem boa relação com a empresa, já notificando de multa a Cavo. Eu já tentei marcar uma audiência com o [prefeito] Fernando [Fernandes], mas eles não me responderam. Eles [governo] achavam que a greve ia durar três dias, e já estamos no 11º dia [nesta quinta].

VERBO – A prefeitura, mesmo com um contrato em vigência, faria um repasse do aumento da categoria?
França – Isso aconteceu no ABC, não estou dizendo que aqui faria. Não conseguimos nem falar com a administração.

VERBO – Em Embu das Artes acabou a greve.
França – Voltamos hoje [quarta-feira], fizemos a assembleia com os trabalhadores, eles aceitaram os 9,5%, e voltamos hoje [ontem] de manhã. Só que vai levar uma semana para recuperar [normalizar] tudo.

VERBO – Durante a greve, havia também um contingente emergencial na rua em Embu?
França – Sim, 70% da categoria, conforme a liminar. Foi cumprido, não teve nenhum problema. Aqui em Taboão que veio até oficial de Justiça para vigiar se estávamos cumprindo ou não, mas estamos cumprindo.

VERBO – O sr. acredita que a greve não acaba até a próxima segunda-feira?
França – Suponho que não. Na segunda-feira vai haver outra audiência, o juiz de ontem [na audiência de terça-feira] já deixou marcada outra audiência [de conciliação], justamente prevendo casos em que não se resolvesse a volta ao trabalho, caso de Taboão. É uma audiência, não julgamento [da greve]. Se nessa audiência não se chegar a um acordo, aí o juiz vai marcar ainda o julgamento.

VERBO – Em Taboão são quantos trabalhadores parados?
França – Entre motorista, coletor e varredor, e administrativo, dá um total de 213, sendo que 30% estão parados, e 70% estão trabalhando principalmente na coleta. Isso tem que ser cumprido, o que significa que nessa garagem [em Taboão] são quatro caminhões [em cada período].

VERBO – Isso significa que nem todo lixo está sendo recolhido.
França – Ah não, de jeito nenhum. A cidade está um caos, a periferia está um caos. A [TV] Globo mostrou hoje [quarta-feira], no “SPTV” ao meio-dia, que os coletores tiveram que trabalhar escoltados pela GCM [guarda municipal], porque o povo está revoltado, [falando] “Vai na minha rua, vai na minha rua”.

VERBO – O caminhão de lixo faz quantas viagens no máximo por turno?
França – Ah, três viagens no máximo. Se chegar em um condomínio, em um dos prédios do Aprígio, por exemplo, e a lixeira estiver cheia, ele [caminhão] já sai dali lotado, já é uma viagem. Esse caminhão vai para o aterro de Caieiras [cerca de 50 km de distância] e volta para fazer a segunda viagem.

VERBO – Nem todo o lixo está sendo recolhido por nem todos os coletores estarem trabalhando…
França – Não só por isso. Nessa situação, com o problema de o lixo ficar acumulado, a população se apavora e começa a colocar mais lixo na rua ainda, quer se livrar do lixo, entendeu? Se tivesse coleta, ela colocaria o lixo normalmente. Acontece de o caminhão passar e a rua ficar tomada de lixo novamente.

VERBO – Essa situação de caos, como o sr. descreve, não poderia ter sido evitada?
França – Poderia, e como poderia. Só que os patrões radicalizaram. Enquanto a nossa proposta inicial era de 11,73%, e não era nenhum exagero, eles vieram com 6,5%, porque… Eu vou te falar porquê. Essas empresas prestam serviço aos municípios, e as prefeituras têm a mania de atrasar os pagamentos. Quando um [sindicato] patronal faz uma proposta de 6,5%, é para nos provocar mesmo para irmos para a greve, e eles nos usar e receber os atrasados. Em muitas cidades do Estado de São Paulo tem prefeitos que não paga três, não paga quatro, seis, oito meses, e a empresa tem que pagar salários, os encargos [trabalhistas], os impostos, fornecedores. Não tenho dúvida de que estão nos usando para atualizar os pagamentos das prefeituras.

VERBO – A Cavo chegou a declarar que a prefeitura de Taboão estaria devendo 14 meses de faturamento.
França – Não posso afirmar se é verdade, não tenho acesso à documentação. Mas só no tempo do [prefeito] Evilásio [Farias (PSB)] a empresa – que na época era a Viva Ambiental – teria ficado oito meses sem receber. A Viva Ambiental foi comprada pela Cavo, que assumiu a dívida também. Deve ter mais alguns [meses de atraso na gestão] do Fernando. Deve ter, eu não posso afirmar, [mas] para eles falarem 14 meses, é isso.

VERBO – O que o sr. diria, como representante dos trabalhadores da limpeza urbana, para a população que está sofrendo esse transtorno com a falta de coleta de lixo?
França – É muito difícil, mas resumiria assim: a gente pede a compreensão da população, porque estamos lutando por salário digno para atendê-la ainda melhor. É o que posso falar.

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