RÔMULO FERREIRA
Reportagem do VERBO ONLINE, em Taboão da Serra
O governo Aprígio (Podemos) comemorou nesta terça-feira (13) que zerou a fila de espera por leitos de UTI a pacientes com covid-19 na UPA Akira Tada, mesmo após 14 doentes morrerem na UPA sem atendimento de terapia intensiva em apenas uma semana, metade somente em dois dias, no fim de semana. Moradores reagiram à “manipulação”. O filho de uma das vítimas classificou a “propaganda” como desrespeito às famílias enlutadas.
O governo alegou que as “ações emergenciais” que tomou no combate à covid-19 “surtiram efeito” ao dizer que as internações na UPA “chegaram a 132% de ocupação em 25 de março e hoje, 13 de abril, está com 40% da capacidade ocupada” e que também ontem “a fila de espera por leitos de UTI, regulada através do sistema Cross (Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde), de responsabilidade do governo do Estado, foi zerada”.
Contudo, apenas na semana passada, 14 pacientes morreram sem vaga de UTI na UPA. Em anúncio visto como falta de empatia com as famílias, o governo citou ter zerado a fila não por ter prestado atendimento adequado que levasse à alta ou por ter conseguido transferência para UTI, mas fez o alarde dois dias depois de seis doentes falecerem na UPA, no domingo (11), o maior número óbitos em um dia na UPA desde o início da pandemia.
Ao lerem o texto oficial do governo reproduzido por um site da região, moradores rebateram a informação da espera por UTI zerada. “Até porque quem ‘tava’ na fila morreu, por isso zerou”, disse uma munícipe. Outra cidadã evidenciou o caos em Taboão. “Claro, já morreram todos. Só da família do meu esposo que esperava por leito de UTI, morreram pai, mãe e filho. Fora alguns conhecidos que também morreram por falta de vaga na UTI”, afirmou.
Um dos seis pacientes que morreram na UPA sem UTI foi o morador Raimundo Moura, de 50 anos, o mais jovem entre os que vieram a óbito no domingo. Após ficar por quase 24 horas no improvisado pronto-atendimento da covid-19 – uma pequena UBS desativada -, no Clementino, ele foi levado à UPA no dia 1º de abril. Ele piorou, foi intubado no dia 8 e morreu três dias depois sem transferência para UTI, apesar da promessa de “prioridade”.
O filho de Raimundo – que cuidou da internação – recebeu o anúncio como escárnio. “Fácil declarar que a fila de espera foi zerada sem contextualizar a real dificuldade que os internados e familiares passaram e que outros continuam passando. Muitas famílias que passam por essa situação acabam até perdendo suas esperanças quando o paciente apresenta um quadro que necessita de leito de UTI”, disse Guilherme Moura, 20, ao VERBO.
“Não é algo a se comemorar ou apresentar como vitória. Deveria ser lamentado que muitas vidas são perdidas, aguardando UTI. Do jeito que é posto parece até que dizem ‘podem chegar mais pessoas nesse estado que somos capazes de zerar a fila'”, frisou Guilherme, em revolta que tomou a família. “Tá doendo demais… perdermos você para a covid, para a falta de UTI, para o mau uso do dinheiro dos brasileiros”, disse uma sobrinha de Raimundo.
O governo Aprígio contabiliza que, desde 5 de março, 46 pacientes morreram na UPA à espera de UTI, por ter inserido as vítimas no sistema estadual de pedido de leito intensivo (Cross). Porém, reconhece que mais 18 internados vieram a óbito na UPA sem terem sido incluídos na fila por vaga porque chegaram “em estado grave e faleceram em horas”, diz a gestão. Ou seja, 64 doentes poderiam ter sobrevivido se tivessem UTI à disposição.
Atendimento de UTI é ofertado pelo Estado, mas os municípios podem criar leitos ou exigir vagas. No dia 10 de março, Aprígio teve a chance de cobrar do Estado leitos de UTI para Taboão, mas se negou a participar de reunião com o ex-prefeito Fernando Fernandes (PSDB) presente, por “picuinha” política. Ele se limita a esperar vaga – “assiste” às mortes. Com 100 dias de governo, Aprígio diz “Taboão melhor a cada dia”, apesar dos 64 óbitos na UPA.