Ney e Hugo perseguem servidor efetivo da Câmara, que denuncia armação 10 dias antes de processo

Especial para o VERBO ONLINE

Servidor denuncia: 'Presidente e mesa-diretora tramam arapuca para exonerar jornalista concursado monitorado [ao] assessorar vereadores", a 10 dias do golpe

RÔMULO FERREIRA
Reportagem do VERBO ONLINE, em Embu das Artes

Em conluio com o prefeito Ney Santos (Republicanos), o presidente da Câmara de Embu das Artes, Hugo Prado (MDB), perseguiu politicamente e demitiu um servidor concursado por escrever para o VERBO. Em prova da “armação”, o jornalista Adilson Oliveira foi notificado do processo administrativo disciplinar em 26 de setembro de 2019, mas foi alertado e denunciou a trama, de forma cifrada, nove dias antes, em 17 de setembro – faz um ano.

O PAD foi instaurado por denúncia do vereador Doda Pinheiro (então sem partido, expulso do PT). Ele apresentou à mesa-diretora centenas de páginas que traziam, na quase totalidade, apenas reproduções de reportagens do VERBO. Pediu para apurar a ligação de Oliveira com este portal, a utilização do cargo para obter “informações privilegiadas” e se usava a estrutura da Câmara e o expediente para “fins particulares e de interesse do jornal”.

Parecer jurídico foi emitido “pela abertura de Processo administrativo e instalação [sic] de comissão processante”, visto que o “requerimento veio com volumosas provas dos alegados [sic] no qual merece melhor análise”, apresentado pelo assistente de recursos humanos, Hélio da Costa Marques, designado assistente jurídico – com gratificação para exercer o cargo, apesar do chefe do departamento na ativa, em prejuízo aos cofres municipais.

Uma portaria listou as supostas faltas do servidor denunciadas por Doda, com base na lei 537/1972. A presidência – Hugo – determinou investigar Oliveira sobre comparecer ao serviço com assiduidade e pontualidade, guardar sigilo sobre assuntos da administração, referir-se publicamente de “modo depreciativo” contra autoridades constituídas, atender pessoas, na Casa, sobre assunto particular, exercer atividades particulares no expediente.

Curiosamente, a mesa-diretora quis apurar também se o servidor se apresentava ao serviço “em boas condições de asseio e convenientemente trajado”. A comissão excluiu a “excrescência”, mas em portaria editada mais de 15 dias depois, em 17 de outubro, e apenas após instada por Oliveira. O PAD teve depoimento de testemunhas, inclusive as citadas pela acusação, que, porém, disseram não ter tratado de assuntos particulares com o servidor na Casa.

Depoente mais esperado, Doda divagou nas denúncias contra o servidor e não apresentou qualquer prova das acusações. Ironicamente, quando fazia oposição ao governo Ney, o vereador conversava com Oliveira para passar informações, denunciar irregularidades na gestão e divulgar as próprias ações, como mostram, à exaustão, mensagens que trocou com o jornalista. Ao passar a apoiar Ney, inclusive virar líder do governo, mudou “de cara”.

Doda chegou a expôr insatisfação pelo VERBO ter noticiado que defendeu Ney em criar a taxa de lixo, o que o fez ser expulso do PT. O servidor disse a Doda que a imprensa não pode deixar de relatar fatos. “Fácil concluir pela leitura das mensagens que o denunciante – quando conveniente e oportuno – enalteceu a linha editorial do VERBO. Já próximo ao governo, mudou o discurso e conceito”, diz o advogado de Oliveira, Marco Aurélio do Carmo.

Para sustentar que textos escritos pelo servidor eram “depreciativos” a autoridades, a comissão chegou a consultar dicionário para definir o termo. “O conceito de informação de fato público não guarda qualquer relação com depreciação. A suposta infração imputada ao acusado é uma aberração jurídica”, afirma Carmo. Ele chamou a atenção de que apenas “16 matérias” foram “censuradas” pela comissão, entre quase 300 relacionadas no PAD.

“Mesmo as 16 matérias observaram integralmente os limites constitucionais do direito de informação e da liberdade de imprensa. São fatos verídicos e, em momento algum, foram divulgados conteúdos ofensivos à honra das autoridades. Tanto que o acusador, vereadores e servidores supostamente ofendidos pelo teor das matérias publicadas pelo portal jamais se socorreram do Judiciário para buscar eventual reparação de danos”, frisa Carmo.

A comissão apresentou ainda um relatório de textos que teriam sido publicados durante o expediente do servidor. O VERBO entregou contra-prova, inclusive com advertência de que os horários compilados pela comissão, via “código-fonte”, consideravam erroneamente o horário original, britânico. Ao admitir o equívoco, ela desconsiderou sete das 18 publicações listadas. Mas acusou que nas demais os horários foram alterados para favorecer Oliveira.

“Logo, a mesma dúvida recai sobre a comissão acerca da veracidade dos registros considerados para demitir o autor. A desqualificação de qualquer meio de prova deve ser fundamentada, não se admitindo meras conjecturas. Ao encerrar o processo prematuramente, sem a produção de prova técnica, a comissão deveria absolver o autor, em observância ao princípio da presunção de inocência – ‘in dubio pro reo’ [na dúvida, a favor do réu]”, diz Carmo.

A comissão também quis imputar ao servidor falta de pontualidade, apesar de Oliveira compensar atrasos, com anuência do diretor-geral Felipe dos Santos. Confrontada com o fato de que membros do jurídico da Casa não cumprem expediente por advogarem “em processos estranhos ao interesse público”, recuou. Oliveira também foi acusado de insubordinação grave. Além de falsa, a denúncia surgiu no relatório final, em cerceamento de defesa.

O processo teve “vícios insanáveis, sobretudo o desvio de finalidade, abuso de poder”, aponta Carmo. “Os fatos e as provas amealhadas demonstraram total improcedência da denúncia de ‘Doda’, que por ira decidiu, a qualquer custo, perseguir o acusado. Com certeza, o edil não agiu sozinho, somente permitiu ser usado como ‘cabeça’ dessa trama ardilosa para prejudicar o autor. O plano foi arquitetado por Ney e Hugo Prado”, afirma a defesa do servidor.

“Logo, a perseguição política é notória. Aliás, constatou-se a extrema ‘competência’ e ‘celeridade’ da comissão e da mesa-diretora na análise e emissão de parecer conclusivo do PAD, de seis volumes, em menos de uma semana. Sem dúvida, agiram com muito interesse e eficiência para ‘se livrar’ do autor antes do recesso”, ironiza Carmo. O servidor teve a demissão anunciada no último dia de serviço no fim do ano, 19 de dezembro. Ele recorre na Justiça.

No entanto, Oliveira soube da armação antes. Em 12 de setembro, ele foi avisado da trama, por meio de vereador da própria base de Ney. Cinco dias depois, ele publicou sobre a perseguição que sofreria em um jornal de grande circulação, “Gazeta de S. Paulo”, com texto disfarçado: “Presidente e mesa diretora tramam uma arapuca para exonerar jornalista concursado monitorado [ao] assessorar vereadores”. Contatada, a gestão Hugo não respondeu.

VEJA PÁGINA DA ‘GAZETA’ COM ‘PENSAMENTO’-DENÚNCIA DE PERSEGUIÇÃO DE NEY E HUGO A SERVIDOR

comentários

  • Não concordo com perseguições, independente da ideologia ou partido político, mas ficou nítido nessa reportagem que o servidor ora exonerado, utilizava o cargo e o horário de serviço para fins pessoais e divulgação de informações sigilosas das quais tinha ciência.
    A mensagem cifrada é mais uma prova de que todos sabiam que esse servido fazia.
    Não tive acesso ao PAD, mas pelo teor da matéria não vi perseguição e sim confirmação do que o ex servidor fazia.

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