Dono da Dolly e ex-assessor de Hugo são condenados por esquema de crime ambiental e corrupção

Empresário foi sentenciado a prisão por desmate ilegal em São Lourenço, suborno e fraudar documentos; Francisco, por falsificar termos de propriedade e criar 'laranja'

Especial para o VERBO ONLINE

Área de cerca de 6 hectares desmatada ilegalmente em São Lourenço da Serra; advogado Francisco Roberto, que foi condenado a prisão, junto com o dono da Dolly | Reprodução

O empresário Laerte Codonho, dono da fábrica de refrigerantes Dolly, foi condenado por crimes ambientais, corrupção e falsificação de documentos em processo por enorme desmatamento ilegal (quase 6 hectares) de mata (atlântica) preservada em São Loureno da Serra, entre 2014 e 2016, para instalação de distribuidora de água mineral. Ele deverá cumprir as penas de 11 anos, 4 meses e 1 dia de reclusão (prisão) e 4 anos, 10 meses e 4 dias de detenção (regime semiaberto).

O Ministério Público (Gedec-Grupo de combate a delitos econômicos) ajuizou a denúncia em 2019. Além do crime ambiental, o empresário foi acusado de pagar propina a policiais civis e ao então diretor de Obras da prefeitura para evitar punições pela destruição da mata. Na sentença, publicada na quinta-feira (13), o juiz Djalma Moreira Gomes Junior, da Comarca de Itapecerica da Serra, afirmou que Codonho era o líder do esquema criminoso e subordinados seguiam suas ordens.

Outras sete pessoas também foram sentenciadas no caso, entre elas o advogado Francisco Roberto de Souza, que por quatro anos, de 2017 a 2020, foi assessor jurídico do então presidente da Câmara de Embu das Artes Hugo Prado, hoje prefeito – “operador” do grupo político do ex-prefeito Ney Santos e de Hugo no Legislativo, ele ficou 8 anos no cargo, e só foi exonerado neste ano, em janeiro, após tentar ajudar a sabotar a eleição de Abel Arantes (SDD) como presidente da Casa.

O VERBO que revelou o envolvimento do assessor com ligação estreita com uma autoridade importante de Embu, à época chefe do Poder Legislativo da cidade, em crimes graves. Foi naquele mesmo ano de 2019, quando o empresário e seus colaboradores, entre eles Francisco Roberto, viraram réus. O MP descobriu os crimes após apreender notebooks, pendrives e celulares com anotações e mensagens de Codonho e um ex-diretor do grupo Dolly relatar o esquema ilícito.

Por dois anos, o desmate ficou impune. O quadro só mudou após uma chuva arrastar muita lama da área degradada à parte urbana de São Lourenço, em impacto no curso natural das águas pluviais. Segundo o MP, então houve quebra de acordo entre colaboradores de Codonho e os agentes públicos, como indica a troca de mensagens: “A PM está fazendo pressão, […] apesar de ter recebido”, diz um representante. “Mandaram parar e tirar as máquinas […]. Vão embargar hoje”.

Dois meses depois, em maio de 2016, com o desmatamento sem poder mais ser ignorado, a Polícia Militar Ambiental registrou um boletim de ocorrência por degradação de vegetação nativa e embargou a obra no local. Segundo um funcionário de Codonho, as máquinas não voltaram mais – o empreendimento parou. “Desceu, desceu bastante lama. Agora não tá descendo mais porque firmou um pouco, eles não estão mexendo mais, né?”, contou o caseiro.

Com a descoberta do esquema, segundo o MP, os representantes do empresário se mobilizaram para “arranjar uma pessoa que, mediante paga, concordasse em aparecer como responsável pelos danos do imóvel” e ocultar o verdadeiro autor do crime ambiental, Codonho, em conluio com policiais civis. Dois investigadores fizeram um relatório falso, que indicava um funcionário do grupo como “sendo o arrendatário do imóvel em que ocorreram os crimes ambientais”.

Aí que Francisco Roberto se apresentou para prestar seus “serviços” – ele havia sido contratado para representar a empresa perante os órgãos de fiscalização. Segundo a Promotoria, paralelamente ao relatório forjado pelos policiais, o advogado e o voluntarioso funcionário “falsificaram, no todo, o INSTRUMENTO PARTICULAR DE ARRENDAMENTO DE IMÓVEL URBANO [maiúsculas conforme denúncia do MP]”, e o “laranja” figurou como arrendatário desde junho de 2014.

Francisco Roberto e outros envolvidos, diz o MP, “falsificaram ainda, no todo, o “INSTRUMENTO PARTICULAR DE RESCISÃO DE CONTRATO DE ARRENDAMENTO DE IMÓVEL URBANO” com o “laranja” arrendatário com data de março de 2016. Com a apresentação dos documentos alterados aos policiais parte do esquema, um simples empregado “assumiu a condição de arrendatário do imóvel justamente no período em que se consumaram os crimes ambientais”.

Entre os documentos apreendidos, o MP identificou rascunhos dos contratos em que a profissão do “laranja” “é rasurada, alterando-se sua real função de encarregado de recebimento para comerciante, na tentativa de tornar crível tal contratação”. Os promotores descobriram que, pelo arrendamento, o forjado inquilino pagaria mensalmente R$ 10 mil, “totalmente inconsistente com a renda do arrendatário, que, na época, recebia aproximadamente R$ 2 mil”.

O arrendamento e a rescisão eram de junho de 2014 e março de 2016, mas as datas foram falsamente inseridas. Dados em HD do grupo apreendido revelam que os contratos foram elaborados em abril de 2016, “comprovando que nunca houve qualquer contrato de arrendamento”. “Esses documentos foram encaminhados [por emissários de Codonho] ao denunciado FRANCISCO ROBERTO, que os alterou inserindo novos parágrafos e os dados” [do “laranja”], diz o MP.

O “laranja” contou que no dia em que foi depor na Delegacia de Meio Ambiente em Embu, em junho de 2016, foi orientado sobre o que deveria falar pelo “dr. Francisco”, “que era realmente o arrendatário, tinha desmatado pouca coisa e não tinha ocorrido nenhum desvio de nascente”. Francisco Roberto – que, na Câmara, trabalhava ao lado da unidade policial – foi denunciado também por intermediar o pagamento de propinas a agentes públicos para evitar fiscalizações.

Acusado de usar sua influência política para facilitar as “condutas criminosas do ‘cabeça’ do esquema [Codonho]”, Francisco Roberto foi condenado pelos crimes de falsidade ideológica e falsificação de documentos particulares. Ele foi sentenciado a 2 anos e 4 meses de prisão, além de multa. O juiz considerou o poder econômico do advogado, por pertencer ao grupo Dolly e ocupar posição de confiança na empresa. Cabe recurso a todos os sentenciados.

OUTRO LADO
Codonho nega os crimes. Ele afirma que, ao comprar o terreno, tinha permissão para construir um galpão na área desmatada, e que não há provas de suborno contra ele. Sobre a falsificação de documentos, ele diz que a assinatura não é dele. Procurado pelo VERBO em 2019, Francisco Roberto alegou inocência. “A denúncia não diz que faço parte de grupo criminoso. Não estou envolvido em crime ambiental. O fato que o promotor me imputou será esclarecido no processo”, disse.

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