ADILSON OLIVEIRA
Especial para o VERBO ONLINE, em Itapecerica da Serra
O Conselho da Mulher de Itapecerica da Serra, em conjunto com a prefeitura, realizou o 1º Fórum de Redes de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, na sexta-feira passada (12), no auditório da administração. O encontro para discussão de políticas públicas para combate à agressão de gênero teve palestra da advogada Sueli Amoedo, ex-coordenadora dos Direitos da Mulher de Taboão da Serra, que orientou a luta e estimulou projetos pela causa.
Cerca de 100 pessoas participaram do fórum, que teve palestras, oficina e outras atividades sobre “O impacto da violência contra a mulher no dia a dia e a atuação de políticas públicas para prevenir e diminuir os índices e o processo de aumento da visibilidade feminina” e marcou o lançamento da cartilha “Mulher, você não está sozinha”. A presidente do conselho, Renata Melo, e a secretária Tiemi Nakano (Desenvolvimento Social) conduziram o evento.
Com visão realista, mas sem revanchismo, Sueli abordou como uma das vertentes de atuação conscientizar os agressores de mulheres, com rodas de conversa, como dos projetos “Tempo de Despertar” (Judiciário) e “Homem Sim, Consciente Também” (Polícia Civil). “O que fazemos na situação de violência, matamos os homens para nascerem de novo? Não. Há os grupos reflexivos. Ajudamos os homens a entenderem que papel têm na sociedade”, disse.
“Ajudamos os homens a perceberem que aquela violência que praticavam era uma herança do que viviam, do que a sociedade impõe aos homens. A sociedade é muito machista, não permite que os homens sejam sensíveis, que tenham sentimento. O que a sociedade cobra é que o homem saia de manhã para trabalhar e volte à noite com o dinheiro, que seja o provedor. Só que hoje a grande parte das casas é mantida pelas mulheres”, ressaltou Sueli.
Ela teve de tratar, porém, de “estágio” anterior, quando incentivou atuação em parceria com instituições. “O primeiro obstáculo da mulher em situação de violência é a questão da autonomia financeira. É importante agilizar a pensão alimentícia e a divisão de bens. Na hora da separação, ela sofre fraude processual. A celeridade da OAB em entrar com ação vai ajudar muito para que não perca patrimônio. Não é pouco o dinheiro que as mulheres perdem”, disse.
Sueli citou que atendeu pelo projeto “Justiceiras”, que também integra, uma jovem cujo marido forjou um assalto na empresa do casal. “Ele levou todas as máquinas, deixou só o salão. Depois, abriu [nova firma] no nome do irmão. Quanto tempo vai levar para provar [a fraude]? Anos. Se provar”, disse. Ela destacou que a imprensa é uma aliada no enfrentamento à violência doméstica. “Casos que têm repercussão têm resolução mais rápida”, comentou.
Ela rebateu críticas à medida protetiva ao associar a ineficácia à falta de comunicação de descumprimento. “Para quem vê de fora, a impressão é que não funciona – muitas mulheres morrem com a medida em vigor. Mas quando descumprida tem que noticiar à Promotoria, à Delegacia da Mulher”, disse. Ela falou que a Patrulha Maria da Penha (GCM) é muito importante para o cumprimento da restrição e pedir que as conselheiras valorizem os patrulheiros.
Sueli indicou ainda capacitar agentes para saber atender a vítima. “Não podemos ser sisudos. Se fechar a cara para a mulher em situação de violência, ela volta, confia? Não. O acolhimento salva vidas. Há casos em que a mulher foi registrar ocorrência, não se sentiu acolhida, o homem depois a matou no fim da tarde, à noite”, disse. Ela chamou a atenção também para o abuso sexual contra crianças. “A violência tem muitos contornos. É preciso enfrentar”, disse.
Sueli passou a destacar a cartilha. Ela disse que a vítima leva em média de 7 a 9 anos para se livrar da violência. “É muito tempo! O período produtivo da mulher ficou aí, de fazer faculdade, ter bom emprego, e se mantém no círculo da violência”, frisou. Expôs que o círculo começa com a “criação de tensão”, pequenas ameaças – “não converse com fulano, com ciclano”, “não pode usar batom, uma calça”. “Ela não percebe, acha que ‘ele se preocupa comigo'”, disse.
“No segundo ato, passa a sofrer agressão verbal, física, quebra de celular. Quando é mais violento, ele se desculpa, [promete] viagens, e ela volta ao círculo de violência, o período de ‘lua-de-mel'”, disse Sueli, para em seguida desfazer mitos. “‘Em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher’? O que estamos fazendo aqui? Metendo a colher! Precisa se pôr na frente da bala? Não. Tem briga no condomínio? Liga para o síndico: ‘Tome uma providência'”, falou.
Sueli disse que a violência doméstica não é um problema privado, “mas de todos, da sociedade”. Desmistificou ainda que a mulher “pede” para ser agredida e “se não gostasse já teria desfeito o relacionamento”. “O primeiro fator para a mulher permanecer no círculo é a violência psicológica. Depois, a não autonomia financeira. Ela só consegue fazer a ruptura do círculo através de muita terapia, ninguém acorda e [diz] ‘hoje não vou apanhar mais'”, enfatizou.
Sueli salientou que “o Creas [centro especializado de assistência social] ajuda demais na ruptura”. “Só conseguimos romper a violência contra a mulher através de denúncias, união das mulheres, de sororidade, de segurar a mão, e de projetos. Não é preciso fortuna para fazer, só de um pouco de boa vontade e pessoas dispostas. Daqui tem que sair encaminhamentos, tem que sair projetos, tem que sair o que vamos comemorar no ano que vem”, encorajou.