ADILSON OLIVEIRA
Especial para o VERBO ONLINE, em Taboão da Serra
EXCLUSIVO. A funcionária comissionada Maryah de Carvalho procurou Aprígio para relatar o desvio e fura-fila de vacinas contra covid-19 na UBS Santo Onofre, mas se viu diante de um pastor assessor direto do prefeito que propôs “acordo” e quis “negociar” para que não chegasse ao chefe do Executivo e entregasse as provas, inclusive avisou o vereador Alex Bodinho (PL) de que faria a denúncia. Ela diz ainda que foi coagida pelo secretário de Saúde.
O VERBO revelou nesta segunda-feira (26) o “esquema” com envolvimento de “funcionários de Bodinho” e do próprio vereador, conforme relato de Maryah, que trabalhou na UBS e fez a denúncia – Aprígio escondeu o fato e ocultou o relatório da sindicância, não informado à população até hoje, quase dois meses após concluído. Ao procurar o governo, do grupo político pelo qual foi candidata a vereadora, ela começou a ter problemas.
No dia 8 de abril, ao ir à prefeitura para denunciar o caso ao prefeito, Maryah diz que foi colocada para conversar com um assessor de Aprígio, Antonio Cerqueira, o pastor Cerqueira, e ouviu uma fala inusitada – o religioso seria amigo do vereador. “Um pastor, que congrega na igreja que o Bodinho frequenta, tentou fazer acordo comigo dentro de uma sala. Ele falou para mim: ‘Você não acha melhor negociar isso antes de chegar no prefeito?'”, afirma.
Maryah tinha sido orientada sobre como falar com Aprígio na prefeitura por outro assessor. “Quando eu cheguei lá, o ‘seu’ Aprígio não tinha chegado ainda. Aí ele me colocou numa sala junto com esse pastor. Ele começou a ver as provas que eu tinha e falou assim: ‘Ah, mas vamos conversar, não precisa chegar a esse ponto. Vamos negociar alguma coisa ou combinar alguma coisa’. Eu falei: ‘Não! Se está errado, está errado!'”, conta a denunciante.
Ela detalha o episódio, ao citar a então diretora da UBS Fernanda Nascimento da Cruz. “Ele falou para mim: ‘Ah, Maryah, o Alex congrega na minha igreja, ele é da minha igreja, será que não dá para a gente conversar antes disso chegar no prefeito? Eu falei: ‘Como assim?’ [Ele:] ‘Não… Vamos fazer assim, eu vou lá [na UBS] e falo que vou tomar a vacina, aí se ela der vai dar problema para nós, não para você'”, diz, sobre o pastor querer contornar a situação.
“Eu falei: ‘Não tem lógica o que você está falando. Você quer que eu converse com o vereador, que eu negocie com você, vocês estão querendo me oferecer dinheiro, é isso?’ Ele: ‘Não, não me leve a mal…’. Eu falei: ‘Não. Se estou vindo fazer uma denúncia, que é grave, ainda mais em época de pandemia, você fala que quer fazer acordo, negociar comigo?’. Não sei o que ele queria, mas provavelmente me dar dinheiro para ficar quieta”, declara.
Maryah acusa que o pastor avisou Bodinho e “vazou” a denúncia. “Foi através dele que o Alex ficou sabendo que eu estava na prefeitura. Ele me filmou lá dentro e mostrou para o Alex. Dez minutos depois que eu saí da sala dele, o Alex chegou na prefeitura. Uma colega do serviço [na UBS] me ligou: ‘Você está denunciando a Fernanda, sobre as vacinas?’ Eu falei: ‘Como você sabe?’ Ela falou: ‘A notícia já chegou aqui, já ligaram para ela, avisando'”, relata.
“Eu não tinha nem entregado as provas para o prefeito quando chegou a notícia lá!”, enfatiza Maryah. Ela acabou exposta aos comissionados de Bodinho ao voltar ao trabalho. “Eu já comecei a ser hostilizada pelos funcionários da UBS, pelo assessor do vereador, pelo vereador. Eu já não conseguia mais dormir, eu chegava na UBS o assessor dele ficava na porta da UBS me encarando, em todo setor que eu estava ele estava atrás de mim”, afirma.
Apesar da provação, no próprio dia, Maryah fez a denúncia e mostrou as “provas” do desvio e fura-fila de vacinas a Aprígio, que disse, porém, para falar com o secretário José Alberto Tarifa (Saúde). A hostilidade teria continuado. “Mandaram no outro dia conversar com ele. O Tarifa veio tentar me coagir, falando: ‘Ah, mas você pode ser acusada de ter compactuado'”, conta, sobre também ter feito o preenchimento de filipetas, brecha para o ilícito.
Maryah rechaçou a fala de Tarifa. “Eu disse: ‘Como vou ser acusada de uma coisa que apresentei? Você está querendo me colocar numa situação que estou trazendo para vocês para se solucionar'”, conta. Após denunciar, ela teria sido retaliada pelo diretor substituto da UBS. “O Vilson me colocou para ficar [na porta] debaixo de sol das 8 da manhã às 5 da tarde. Me tiraram da vacina, porque não queriam que eu visse mais nada de errado”, declara.
Bodinho teria sido “acobertado” pelo governo, enquanto Maryah foi expurgada da UBS menos de uma semana depois de denunciar. “Resolveram me tirar de lá. O Alex colocou toda a turma dele na recepção. Conversou com o Vilson e saiu falando: ‘Com o meu pessoal ninguém vai mexer. Obrigado, Vilson, por ter conversado comigo’. Falei: ‘Fizeram acordo com o Vilson também, as pessoas do Alex na recepção são o que estão fazendo coisa errada'”, diz.
Ela acabou abandonada pelo governo. “Conversei com um monte de gente lá [assessores]. Eu falei: ‘Vocês me pediram as provas, eu apresentei, mostrei o que estava errado. A informação vaza aqui de dentro, eu correndo risco, e vocês simplesmente lavaram as mãos'”, conta Maryah. O secretário de Governo teria se esquivado. “Mario de Freitas não me atendeu, simplesmente falou que eu ia ser transferida”, diz. Ameaçada, ela deixou Taboão.
OUTRO LADO
O VERBO questionou o pastor Cerqueira sobre ter proposto “acordo” e “negociar” com Maryah ao saber da denúncia (“o senhor quis dar dinheiro?”). Indagou Tarifa acerca da acusação de que tentou coagir a funcionária. Ambos ficaram em silêncio. Perguntado se tentou abafar o caso para não atingir o governo e para acobertar o vereador, Freitas negou que se recusou a receber Maryah. “Quando foi isso? Nunca falei com essa senhora”, disse.
MARYAH CITA QUE PASTOR ASSESSOR DE APRÍGIO QUIS ‘NEGOCIAR’ E ‘COAÇÃO’ DE SECRETÁRIO DA SAÚDE