Jovem sofre racismo em loja no Pirajuçara de rede de padarias, denunciam clientes

Especial para o VERBO ONLINE

ADILSON OLIVEIRA
Especial para o VERBO ONLINE, em Taboão da Serra

Um jovem negro foi vítima de ato de racismo na noite desta quarta-feira (3) em uma padaria na região do Pirajuçara, em Taboão da Serra, praticado por um funcionário da rede, mas de outra loja. Duas clientes da Belas Artes na estrada Kizaemon Takeuti testemunharam e denunciam que um homem identificado como Orlando chamou o rapaz de 22 anos (nome não será revelado), que foi retirar doações no estabelecimento, de “vagabundo, negro safado, nojento”.

Padaria Belas Artes no Pirajuçara, em Taboão da Serra
Padaria Belas Artes no Pirajuçara, em Taboão, onde jovem (detalhe) ouviu ofensas racistas diante de clientes

Uma das clientes que presenciaram a ofensa racista, a supervisora administrativa Zezé Melo conta que, pelas 22h30, estava com o marido na fila para comprar pão quando o homem se aproximou e inicialmente atrapalhou o fluxo das pessoas, mas depois se voltou para o jovem e perguntou o que queria. O rapaz respondeu que só aguardava para retirar doação. “O senhor Orlando mandou ele se retirar, pois a padaria não ajuda ‘vagabundo, negro safado'”, relata.

O homem falou ainda ao jovem “que era amigo do proprietário e quem mandava era ele”. “O rapaz, envergonhado, saiu sem reação. Fomos atrás dele, mas, abatido, preferiu ir embora”, conta Zezé, 41. Ela foi à gerente, que confirmou que Orlando é funcionário da empresa, “porém de outra padaria, e estava lá como cliente”. “O meu marido é advogado e já verificou que o tal Orlando realmente é funcionário, trabalha no km 274 [Régis Bittencourt] no Jardim Salete”, afirma.

Zezé diz que a gerente prometeu passar o fato para superiores, “mas a nossa indignação é maior”, afirma. “Se o rapaz aceitar, meu marido pretende entrar com um processo contra Orlando”, comenta. Ela diz não ter dúvida sobre a tipificação do crime. “Racismo, caso o rapaz for querer realmente processar. É triste ver isso, lastimável, algo que não se espera que aconteça com ninguém”, salienta. Ela conta que o homem estava embriagado, “mal se aguentava em pé”.

A auxiliar de cozinha Cilene Silva também conta ter presenciado a ofensa racial. “Venho denunciar o racismo. Um rapaz bêbado começou a xingar de forma racista um rapaz de pele morena que estava lá para retirar doação que faz para moradores de rua, um rapaz trabalhador que foi humilhado. O coitado saiu da padaria totalmente sem graça, sem nem coragem para se defender. Ele [agressor] disse que tem moral, que conhece o dono, é funcionário”, relata Cilene, 28.

Segundo ela, “o rapaz ofendido foi embora, não levou nem a doação, o Orlando não permitiu”. Cilene, negra, conta que “muitas testemunhas só ficaram olhando” e a gerente nada fez. “Sou mãe, meus filhos também são negros, não quero que aconteça com eles. Acompanho o site, essas coisas devem ser denunciadas para não acontecer”, diz, sobre resolver denunciar. Leitoras, Zezé e Cilene procuraram o VERBO quase ao mesmo tempo – diferença de apenas seis minutos.

O VERBO localizou o jovem. Ele vai sempre à Belas Artes pegar pães. “Além de cliente, sempre vou retirar doação que a padaria me dá. Depois, vou em casa preparar sopas e embalo para poder levar aos moradores de rua”, contou, sobre a ação voluntária pessoal – não ligada a ONG – no Pirajuçara e no Campo Limpo (zona sul de SP). Ele sabe a importância. “Já fui morador de rua, sei o que é passar fome. Além de comida, levo cobertores, roupas em tempo de frio”, disse.

Ele ficou “mal”. A reportagem perguntou se podia repetir do que foi chamado. “Safado, vagabundo, preto nojento, que a padaria não recebe pessoas do meu nível”, contou, traumatizado. “Não esperava tanta ofensa, tanta discriminação. Sei lá, mas para mim foi como um pesadelo e depois acordei. Porém, não consigo mais pisar naquele estabelecimento. Hoje resolvi tomar café em uma padaria próximo às Casas Bahia [Pirajuçara]”, disse o egresso das ruas e hoje copeiro.

O jovem disse não querer “prejudicar” quem o agrediu verbalmente. “A princípio, fui aconselhado a processá-lo, porém não quero prejudicá-lo no trabalho por um fato que uma boa conversa pode mudar [resolver]. Assim como eu trabalho pelo meu sustento e da minha família, creio que com ele não é diferente”, disse. Ele ligou na padaria onde o homem trabalha. “Amanhã vamos conversar pessoalmente. Ele se desculpou, disse que estava bêbado, enfim”, contou.

OUTRO LADO
A Belas Artes disse ao VERBO que não aceita racismo. “Essa conduta não partiu de ninguém em cargo de confiança, muito menos do [dono] Adalberto [Camelo], não compactuamos com essa atitude, ao contrário, treinamos nosso pessoal. Já pedi para o gerente ligar para o cliente e pedir desculpas. O funcionário está afastado, ele caiu, machucou a mão. Assim que possível, ele será mandado embora”, disse o advogado Marcelo Moreira. Orlando não foi localizado.

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